sábado, 11 de agosto de 2018

Dia do Concelho do Marco de Canaveses-Dia de Nossa Senhora do Castelinho

Poucos concelhos terão na sua origem uma história tão próxima da natureza humana, tão configuradora da ideia de segurança, de transcendência e bem-estar, como o Marco de Canaveses.

No dia 3 de janeiro de 1852 faleceu o sargento-mor das milícias do julgado de Bem-Viver, José Joaquim de Abreu e Lemos, fidalgo do solar de Carrapatelo. Era dia de feira no lugar do “Marco”, assim chamado pela pedra (marco) que aí limitava dois coutos que vieram a dar origem às freguesias de Fornos, S. Nicolau e Tuias. Por se situar numa planura e no limite das comarcas de Canaveses, Tuias e Soalhães era nesse espaço que se realizavam famosas feiras nos dias 3 e 15 de cada mês. Também foi nesse local que se levantou a Casa Municipal do Concelho de Soalhães e mais tarde, depois da fundação do Concelho do Marco o  edifício da sua Câmara Municipal. 


A morte do Fidalgo de Carrapatelo foi notícia na Feira que se realizava nesse dia. Um tal Vinagre, que fazia comércio de azeite e de outros géneros, estava com alguns problemas financeiros e sonhou logo com o “golpe”. Levou a nova ao José e ao António, morgadinhos de Canaveses (filhos de um fidalgo falido) que já haviam colaborado com o Zé do Telhado. Os três avaliaram as vantagens do assalto à casa do Fidalgo e os morgadinhos levaram a sugestão ao Zé do Telhado. Ficou combinado contratar gente de confiança que, no dia 7, se encontraria, à meia-noite, numa corte situada junto à capela de S. Braz, em Fandinhães, Paços de Gaiolo, para planear o assalto que se realizaria no dia seguinte. (foto da capela)

 
Acertadas as incumbências de cada um, no dia 8, ao princípio da noite, a quadrilha, que comportava cerca de 30 homens, capitaneada por Zé do Telhado, partiu para o roubo. Por volta das nove horas forçaram a porta da cozinha e penetraram no Solar. O Zé do Telhado obrigou D. Ana Vitória, filha do Fidalgo, a entregar-lhe todos os valores que seu pai lhe tinha deixado. Entretanto outros elementos da quadrilha iam roubando as peças
de ouro e prata que as senhoras que, nessa altura, estavam no Solar traziam. O pior, foi terem morto a tiro o criado João Carvalho que se opôs à entrada da quadrilha. Tudo isto criou uma tremenda insegurança e manchou a dignidade do povo desta terra. O Sr. Adriano da Picota, como era conhecido o deputado e administrador do Concelho de Soalhães, jurou que prenderia Zé do Telhado, estivesse onde estivesse. Solicitou ao Governador Civil do Porto, Visconde de Podentes, um alvará que lhe permitisse entrar nos concelhos vizinhos para prender o salteador e a sua gente, o que lhe foi concedido. Simultaneamente envolveu os seus primos António Nogueira Soares, Afonso Joaquim Nogueira Soares e Rodrigo Nogueira Soares, notáveis personalidades do movimento da Regeneração, na necessidade de criar um concelho que agregasse as comarcas vizinhas por forma a desenvencilhar as autoridades dos empecilhos burocráticos, que não permitiam à justiça de uma comarca entrar noutra, sem autorização do seu administrador.

 Pelo Decreto de 31 de Março de 1852, D. Maria II satisfaz a vontade de Adriano José de Carvalho e Mello e cria o Concelho do Marco de Canaveses. 
No artº 1º estabelecia: “São reunidos num só concelho, os concelhos de Soalhães e de Benviver”.  E no artº 2º dizia-se:  “O novo concelho passa a ser denominado Marco de Canaveses” e os seus habitantes marcoenses.



Adriano José de Carvalho e Mello era um devoto de Nossa Senhora da Natividade (protetora da maternidade e do aleitamento). A
 
Divindade terá aparecido num penedo do lugar conhecido por Castelinho onde se construiu, em tempos muito antigos, uma Ermida. Diz-se que no penedo ainda há marcas dos pés da Virgem, onde “não pega o musgo, nem a muinha”.

Um dos sonhos de Adriano José de Carvalho e Mello era transformar a Ermida num Santuário semelhante ao Bom Jesus de Braga (símbolo do sucesso da Restauração: libertação de Portugal do jugo espanhol), onde trabalhou, como como santeiro, um marcoense ilustre, Monteiro da Rocha, irmão de uma das personalidades mais famosas no sé. XVIII, o Padre José Monteiro da Rocha, astrónomo. lente na Universidade de Coimbra, natural de Canaveses. 

Já como administrador do Concelho  fundou, com esse sentido, a irmandade do Castelinho e procurou que a devoção à Nossa Senhora do Castelinho se tornasse num símbolo da proteção divina, da regeneração e do patriotismo. A cumprir essa intenção, ainda hoje os combatentes têm um encontro anual no Castelinho.
Faleceu, sem ver satisfeita a sua vontade de consagrar o Concelho do Marco de Canaveses a nossa Senhora do Castelinho.
As figuras do núcleo da União Nacional pretenderam tornar feriado municipal o dia 28 de Maio. Mas a política do governo tinha, como princípio,  fazer dessa data um feriado que representasse o espírito de corpo da nação e, por isso, tornou ilegal qualquer marcação de feriados concelhios nessa data.

No dia 22 de Setembro de 1949, o recém-nomeado presidente do Concelho, Dr. Cabral de Matos, dentro do espírito do Fundador do Concelho, faz aprovar em reunião da Câmara, a consagração do Marco de Canaveses a Nossa Senhora do Castelinho e é fixado o dia 8 de Setembro (dia da celebração religiosa), feriado municipal.
No dia 12 de Setembro de 1957, o ex-libris do Marco, o seu Jardim Municipal, recebeu, com pompa e circunstância, o busto do Fundador do Concelho, custeado por uma subscrição pública. Não era para ser aí colocado, mas em frente ao edifício da Câmara, como seria, por direito, o seu local próprio. Assim pensavam os marcoenses que defendiam que o Jardim Municipal, sendo pensado à imagem das “Cidades-jardim” (uma ideia romântica defensora do bem-estar e qualidade de vida) pelo presidente Dr. Cabral de Matos, notário no Concelho e natural de Mangualde, deveria honrar a sua memória, recebendo o seu nome. 
Nas contendas políticas da altura ganhou a fação contrária a esta ideia. O busto de Adriano José de Carvalho e Mello foi, em festa, colocado no Jardim Municipal e a inauguração da obra do Dr. Cabral de Matos foi sendo adiada, acabando por ficar esquecida até ao nosso tempo, talvez para não lembrar o seu obreiro. Mas o Jardim, mesmo sem ser inaugurado, foi incorporando diferentes inaugurações, afirmando-se como uma das melhores referências do Concelho.

JOÃO BAPTISTA MAGALHÃES