Minhas
Senhoras e meus Senhores:
Comemoramos
hoje o 45.º aniversário da revolução de abril. Mais que exaltar os
protagonistas, que nunca é demais, urge fazer uma reflexão sobre o caminho
percorrido.
Saímos
de um contexto de isolamento internacional, onde o analfabetismo atingia
números significativos e a liberdade de expressão, só constava no imaginário.
Os
militares conduziram a revolução e devolveram aos políticos a condução dos
destinos do país.
A
realização de eleições livres, a democratização do acesso à educação e não
menos significativo, o fim de uma guerra que consumia recursos humanos e
materiais, que limitava significativamente o crescimento económico do pais e o mantinha
isolado no contexto internacional, foram algumas das conquistas alcançadas.
Há
45 anos a Escola não estava preparada para receber todos os alunos, os recursos
humanos e materiais eram escassos. Hoje, temos que questionar se a mesma escola
dita inclusiva está a formar tendo por referência os desafios que estas
gerações vão encontrar.
Não
podemos ignorar que está em curso o que alguns designam como a 4.ª revolução
industrial, a qual irá colocar novos desafios, num contexto de uma economia
global, fortemente competitiva e fomentada pela inovação, onde serão
necessários recursos humanos mais qualificados, maior flexibilidade e em
aprendizagem contínua. A presença de robôs no nosso quotidiano, cidades sem
semáforos e meios de transporte autónomos é uma realidade que começa a
desenhar-se. A medio prazo é previsível que 45% dos empregos disponíveis podem
ser automatizados, com particular incidência nos que não são geradores de novas
ideias e não exigem comunicações complexas e profundidade de pensamento. Para
dar resposta a estas novas exigências do mercado de trabalho são necessários
trabalhadores com elevadas capacidades.
É
comum dizer-se que hoje temos a geração mais bem preparada, gostaria de
acompanhar este raciocínio mas, salvo melhor opinião, temos uma geração com
habilitações académicas mais elevadas.
A
revolução de abril criou as condições à participação de todos na vida politica.
No entanto, ao longo dos anos temos vindo a assistir passivamente à captura do
regime pelos partidos políticos. Hoje, só pode ser eleito deputado quem
integrar a lista de candidatos apresentadas pelas várias forças políticas.
Paradoxalmente, o legislador que não permite candidaturas independentes, não se
opõe a que, uma vez eleitos, os deputados se afastem na força que integraram,
se tornem independentes e exerçam as funções para a qual foram eleitos.
Não
será pois de estranhar o afastamento dos jovens do exercício e prática da actividade
politica. Uma das principais conquistas de abril é parcialmente ignorada pela
juventude.
Para
este estado poderemos elencar um conjunto de variáveis que podem explicar
parcialmente este aparente desinteresse.
- Os partidos tem colocado obstáculos à
participação dos cidadãos independentes na sua actividade. Privilegia-se a
democracia representativa em detrimento da democracia participativa. - Os
cidadãos que optam por não estar inscritos em qualquer força partidária, estão
automaticamente afastados da discussão da constituição das listas a apresentar
a sufrágio. A meritocracia tarda em afirmar-se.
-
Em minha opinião, a emergência de uma classe profissional de políticos, não
obstante, as ténues tentativas de limitar os mandatos, tem criado dificuldades
para a afirmação de novos protagonistas.
-
Os partidos utilizam uma linguagem onde proliferam constructos que o eleitor
não domina ou desconhece, criando neste, erradamente, a ideia que são todos
iguais logo, é desnecessário votar. Se há 45 anos existia uma elevada taxa de
analfabetismo, hoje, a taxa de iliteracia para a política é significativa.
Não
se pode apelar à participação do eleitor e simultaneamente apresentar as mesmas
condições para o exercício desse direito aqueles que se verificaram há 44 anos nas
eleições para a Assembleia Constituinte. Não se compreende que numa época em
que a mobilidade e as novas tecnologias são palavras de ordem as mesmas não
tenham reflexo neste ato tão significativo na nossa vida coletiva. Naturalmente
que algo tem que mudar sem deixar de assegurar a verdade dos resultados.
A
democracia não é um dado adquirido, tem que ser alimentada com a participação
cívica de todos. Temos a obrigação de legar à geração seguinte condições e
ferramentas que permitam que os obstáculos com os quais se vão defrontar sejam
mais facilmente ultrapassados. Para tal é necessário uma aposta séria na
educação para a cidadania.
A
revolução reconstrói-se todos os dias.
Viva
o 25 de abril!
António
Moreira Ferreira
(intervenção do Presidente da Associação dos Amigos do Marco no almoço comemorativo do 25 de Abril de 2019 - Pensão Magalhães - 25-04-2019)