segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

A vida num Concelho







Canaveses era, como outros concelhos que a reforma liberal de 1836 extinguiu, pequeníssimo. Constituía-se apenas por duas freguesias: S. Nicolau e Sobretâmega. Mas, em virtude do seu prestígio, tinha ascendência sobre os concelhos vizinhos.
Essa notoriedade vinha-lhe do tempo dos romanos e, ainda, por ter sido uma beetria ( um território, cujos habitantes tinham o privilégio de eleger senhor que os defendesse e protegesse as liberdades conquistadas), ser rica na cultura do linho, situar-se junto ao rio Tâmega e possuir em S. Nicolau uma  Albergaria, um Hospital, Capelas que, tal como a Ponte, foram mandados construir por D. Mafalda, mulher de Afonso Henriques. Convém recordar que a Rainha, bem como a sua neta, a beata Mafalda, que terá sido criada por D. Urraca Viegas de Riba Douro, patrona do Mosteiro de S. Salvador de Tuías, foram grandes beneméritas desta região, compreendida entre o que é, hoje, Penafiel, Amarante, Baião, etc.
Tal como os outros concelhos,  teve origem num antiquíssimos couto, terra atribuída por carta régia a nobre ou clérigo. Foi a centralização do poder régio que  levou ao desaparecimento dos coutos e à criação de circunscrições administrativas.
A governação de Canaveses foi exercida por uma Assembleia Municipal aberta, reunindo geralmente com 15 a 30 membros e, por um executivo, constituído por um juiz ordinário, dois vereadores e um procurador do concelho. Não tinha presidente. Todos os cargos eram providos por eleição com carácter obrigatório. O colégio eleitoral era constituído por nobres locais e pelo povo.
Havia, ainda, um meirinho, espécie de chefe da polícia, para fazer cumprir as pragmáticas (decisões do rei com valor de lei), as ordens do juiz ordinário e as decisões da Assembleia. Só a Assembleia era deliberativa, sendo as suas reuniões convocadas por pregões públicos. O executivo reunia-se uma ou duas vezes por semana para tratar de problemas rotineiros. 

Ao Juiz Ordinário competia aplicar a justiça civil e criminal, defender os órfãos e fazer cumprir e aplicar a sisa. Tinha como código ético guardar segredo de justiça e fazer cumprir o direito e os deveres das partes. Os Vereadores eram responsáveis por “servir bem e na verdade” as preocupações da população e as determinações da Assembleia. O Procurador do Concelho tinha como incumbência requerer tudo o que fosse a favor da população e a bem da realeza. Para fiscalizar esta organização e ouvir reclamações havia o Corregedor Régio que, periodicamente, percorria os concelhos.
O Juiz Ordinário cessante presidia às eleições e à tomada de posse dos eleitos. Cada empossado jurava, com a mão sobre o evangelho, cumprir os seus deveres e defender o bem-comum.
O Concelho tinha um orçamento que se apoiava na receita dos impostos, das adjudicações para venda de produtos, (feita por leilão junto ao Pelourinho de S. Nicolau),  e, ainda, recebia, como Tuías e Soalhães, a terça parte das transacções cobradas aos produtos vendidos na feira do Marco.
Sempre que o orçamento não chegava, tinha que haver cooperação, como, por exemplo, para a limpeza das estradas, dos caminhos e arranjo das fontes. Quem não cooperasse era multado ou preso. Por volta de 1800 o sr. Manuel Joaquim de Sarze Pereira, do lugar de Agrochão foi multado em 500 reis por não ter consertado a estrada na parte correspondente à sua testada, e o sr. João Guedes, por motivo idêntico, foi preso.
Quando surgia uma crise económica, naturalmente o custo de vida aumentava e havia protestos. Em 1810, os padeiros de Canaveses não estiveram com meias medidas: fizeram greve à venda de pão, enquanto não baixassem o custo do milho ou do centeio.
Era assim a vida dos concelhos, com a qual haverá muito a aprender, sobretudo no papel dos órgãos administrativos e na capacidade das populações fazerem vingar os seus interesses. De seguida, traremos o que nos diz o Padre Torquato Peixoto de Azevedo sobre os concelhos de Tuías e Soalhães.
João Baptista Magalhães

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